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O Dia em que os Professores Foram Apagados do Sistema: Como um Clique Administrativo Pôs em Risco a Alma da Educação Pública
Em uma sexta-feira aparentemente comum, enquanto milhares de alunos em Campinas voltavam para casa após mais um dia de aulas, um grupo de professores recebeu uma notificação que soou como um desligamento de servidor: “Seu vínculo será encerrado na próxima terça-feira.” Sem aviso prévio, sem negociação, sem explicação plausível. Apenas um comunicado seco, como se vidas, projetos e famílias fossem variáveis descartáveis em uma planilha de corte orçamentário.
Mas o que parecia ser o fim de um ciclo revelou-se o início de uma crise de confiança institucional — e de uma luta por dignidade profissional que ecoa muito além das fronteiras de Campinas Oeste.
A Notícia que Sacudiu as Salas de Aula
Na manhã de 26 de setembro de 2025, docentes responsáveis pelas Salas de Leitura e pelo **PROATI (Projeto de Apoio à Tecnologia da Informação)** foram informados, de forma abrupta, que seus contratos seriam rescindidos em apenas quatro dias. Muitos haviam deixado suas turmas regulares para assumir essas funções especializadas — uma exigência explícita da própria Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc). Agora, viam-se à beira do desemprego, sem perspectiva de retorno às salas de aula tradicionais.
> “Vários professores, para assumir esse cargo, tiveram que largar as suas aulas porque era uma exigência. E aí, de repente, recebem a notícia do dia para a noite de que estariam demitidos”, denunciou Flávia Teles, professora de História e Sociologia.
O Recuo Tímido da Seduc
Na terça-feira, 30 de setembro — data marcada para o efetivo desligamento —, um áudio circulou nas redes sociais anunciando a suspensão temporária dos desligamentos. Mas longe de acalmar os ânimos, a medida gerou mais desconfiança. Afinal, como confiar em uma instituição que ameaça cortar vínculos essenciais à educação pública sem sequer oferecer um plano de transição?
O recuo foi interpretado não como um gesto de responsabilidade, mas como uma manobra tática diante da pressão social. “Esse comunicado surpreendeu vários professores, deixando-os diretamente desempregados, na rua, sem saber como vão sustentar suas famílias”, lamentou Flávia.
Manifestação nas Portas da Burocracia
Diante da incerteza, os professores não se calaram. Reuniram-se em frente à Diretoria Regional de Ensino (DRE) de Campinas Oeste, na Vila São Bernardo, em um ato simbólico e contundente. Cartazes com frases como “Leitura não é luxo, é direito” e “Tecnologia sem professor é só máquina” ecoavam o cerne do conflito: **a desvalorização de políticas pedagógicas que funcionam**.
Uma carta foi entregue à DRE pela oposição docente, exigindo transparência, estabilidade e respeito aos compromissos assumidos. Afinal, como construir uma escola inclusiva se os pilares que sustentam essa visão são removidos sem aviso?
Quem São os Professores das Salas de Leitura e do PROATI?
Antes de julgar o corte como “mera reestruturação”, é essencial entender quem são esses profissionais e **por que suas funções são insubstituíveis**.
As Salas de Leitura: Oásis de Palavras em um Deserto Digital
As Salas de Leitura não são meros depósitos de livros. São espaços vivos, mediados por professores formados em Letras, História ou Pedagogia, que transformam o ato de ler em uma experiência coletiva, crítica e afetiva. Em tempos de algoritmos que ditam o que consumimos, esses educadores ensinam os alunos a pensar com autonomia, a questionar narrativas e a se reconhecerem como sujeitos históricos.
O PROATI: Quando a Tecnologia Encontra a Pedagogia
Já o PROATI vai além do suporte técnico. Seu objetivo é integrar tecnologia e ensino de forma pedagógica, não apenas instrumental. Os professores do projeto capacitam colegas, desenvolvem atividades interdisciplinares com recursos digitais e garantem que a inclusão tecnológica não se torne uma nova forma de exclusão.
Sem eles, as escolas correm o risco de transformar laboratórios de informática em salas de espera digitais — onde os alunos clicam, mas não aprendem.
O Verdadeiro Custo de um Corte Administrativo
Cortar custos parece racional em tempos de ajuste fiscal. Mas qual é o custo humano — e pedagógico — dessa decisão?
Desmonte de Políticas Públicas Pós-Pandemia
A pandemia escancarou as desigualdades educacionais no Brasil. Enquanto alguns alunos tinham acesso a tablets e internet de alta velocidade, outros lutavam para assistir às aulas por celulares compartilhados. Foi nesse contexto que projetos como o PROATI e as Salas de Leitura se tornaram verdadeiros salvavidas pedagógicos.
Agora, em vez de ampliá-los, o governo estadual ameaça extingui-los. É como apagar o fogo com gasolina: combater a crise educacional desmontando justamente os mecanismos que a mitigam.
O Impacto Psicológico nos Professores
Além do prejuízo institucional, há o trauma profissional. Professores que dedicaram anos a projetos inovadores veem seu trabalho reduzido a uma linha de planilha. A insegurança gerada por essa instabilidade não afeta apenas suas finanças, mas sua **identidade profissional**.
> “A pessoa se organiza financeiramente, a logística até o final do ano. De repente, você tira da sala de aula ou do projeto que ele está desenvolvendo, e isso desagrega totalmente esse professor ou essa professora”, alertou Hamed Bittar, diretor regional da Apeoesp em Campinas.
A Luta por Estabilidade Não é Só dos Professores
É fácil pensar que essa é uma briga corporativa. Mas não é. É uma defesa da escola pública como espaço de transformação social.
Alunos Perdem Mais do que Livros e Computadores
Quando um professor de Sala de Leitura é demitido, os alunos perdem um mediador de leitura — alguém que os ajuda a decifrar o mundo através das palavras. Quando um professor do PROATI sai, perde-se o elo entre tecnologia e aprendizagem significativa.
Esses não são “cargos complementares”. São funções centrais em uma educação que pretende ser crítica, inclusiva e contemporânea.
A Escola como Laboratório de Democracia
Mais do que ensinar conteúdos, a escola pública é onde se aprende a conviver, a debater, a sonhar coletivamente. Projetos como os ameaçados pela Seduc são laboratórios de cidadania. Cortá-los é, na prática, enfraquecer a própria democracia.
Por Que a Seduc Age com Tanta Leveza?
Aqui surge uma pergunta incômoda: por que a Secretaria da Educação age como se esses profissionais fossem descartáveis?
A Ilusão da Eficiência Administrativa
Há uma lógica perversa por trás desses cortes: a de que a educação pode ser gerida como uma empresa. Nessa visão distorcida, professores são “recursos humanos”, projetos são “linhas de custo” e alunos, “indicadores de desempenho”.
Mas a educação não é uma fábrica. É um ecossistema vivo, onde cada elemento — por menor que pareça — sustenta o todo.
Falta de Diálogo com a Categoria
O mais grave não é apenas o corte, mas a ausência total de diálogo. Nenhum sindicato foi consultado. Nenhum plano de transição foi proposto. A comunicação foi feita por e-mail ou áudio viralizado — como se a vida de centenas de famílias fosse um assunto secundário.
O Que os Professores Realmente Querem?
Diante do caos, os docentes não pedem privilégios. Pedem previsibilidade.
Garantia até o Fim do Ano Letivo
A exigência mínima é clara: manter os vínculos até dezembro de 2025. Isso permitiria que os professores planejassem suas vidas, buscassem alternativas e, principalmente, concluíssem os projetos em andamento com dignidade.
Transparência sobre o Futuro das Políticas
Além disso, querem saber: as Salas de Leitura e o PROATI serão mantidos em 2026? Se sim, com quais critérios? Se não, qual será o plano de substituição? Até agora, silêncio.
O Papel do Sindicato na Defesa dos Direitos
A Apeoesp tem atuado como voz institucional da indignação coletiva. Mas sua força depende da mobilização de base. A manifestação em Campinas Oeste é um sinal de que os professores não aceitarão passivamente o desmonte silencioso da educação pública.
Lições que Vêm de Outras Regiões
Esse não é um caso isolado. Em Minas Gerais, em 2024, cortes semelhantes nas equipes de apoio pedagógico geraram ondas de protestos e, eventualmente, reversões governamentais. Em Pernambuco, a valorização de mediadores de leitura foi elogiada pela Unesco como **modelo de política educacional pós-pandemia**.
Ou seja: há caminhos alternativos. Basta querer enxergá-los.
A Educação Não Pode Ser Tratada como Variável de Ajuste
Enquanto economistas discutem superávits primários, professores discutem como manter uma criança interessada em ler. Enquanto gestores falam em “otimização de recursos”, educadores sabem que o maior recurso é o tempo humano investido com cuidado.
Cortar esses vínculos não economiza — empobrece. Empobrece o currículo, empobrece a sala de aula, empobrece o futuro.
O Que Está em Jogo Além dos Empregos?
Mais do que postos de trabalho, está em jogo o modelo de escola que queremos para as próximas gerações. Uma escola que prioriza a padronização ou uma que cultiva a criatividade? Uma que vê a tecnologia como fim ou como meio? Uma que lê o mundo ou apenas repete manuais?
A resposta está nas Salas de Leitura. Está nos laboratórios do PROATI. Está nos olhos dos professores que, mesmo ameaçados, continuam acreditando.
Conclusão: Quando o Sistema Esquece os Humanos, Todos Perdemos
O recuo da Seduc foi tímido, mas revelador. Mostrou que, diante da pressão, a burocracia cede — mas não se corrige. Enquanto isso, os professores seguem na linha de frente, sabendo que cada aluno que lê um livro ou programa um robô por conta deles é uma vitória contra a indiferença institucional.
A verdadeira eficiência na educação não está em cortar, mas em investir com inteligência e empatia. E enquanto o Estado tratar seus educadores como variáveis descartáveis, continuaremos a formar não cidadãos, mas espectadores de uma crise que poderia ser evitada.
A pergunta que fica não é “quanto custa manter esses professores?”, mas “quanto custará perdê-los?”.
Perguntas Frequentes (FAQs)
1. O que são as Salas de Leitura na rede estadual de São Paulo?
As Salas de Leitura são espaços pedagógicos mediados por professores especializados, cujo objetivo é promover a leitura crítica, o acesso à literatura e o desenvolvimento da autonomia intelectual dos alunos, especialmente em contextos de vulnerabilidade social.
2. Qual o papel dos professores do PROATI nas escolas?
Os professores do PROATI atuam como facilitadores da integração entre tecnologia e ensino. Eles não apenas dão suporte técnico, mas desenvolvem atividades pedagógicas com recursos digitais, capacitam outros docentes e garantem que a inclusão tecnológica seja significativa e não apenas formal.
3. Por que os cortes afetaram justamente esses profissionais?
Embora a Seduc não tenha divulgado oficialmente os critérios, acredita-se que esses cargos tenham sido classificados como “temporários” ou “de apoio”, o que os torna alvos fáceis em momentos de contenção orçamentária — apesar de seu impacto pedagógico comprovado.
4. Os professores demitidos podem retornar às salas de aula regulares?
Muitos não, pois ao assumirem funções nas Salas de Leitura ou no PROATI, tiveram que abrir mão de suas turmas regulares por exigência da própria secretaria. Isso os deixa em uma situação de limbo profissional, sem garantia de realocação.
5. O que a sociedade pode fazer para apoiar esses professores?
Além de pressionar deputados e secretários por transparência, a sociedade pode valorizar publicamente o trabalho desses educadores, participar de atos de solidariedade, compartilhar informações nas redes sociais e exigir que a educação seja tratada como prioridade, não como gasto.
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